
O Brasil está mais velho e mais ativo. Segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a proporção de pessoas com 60 anos ou mais chegou a 15,6% da população, um salto que pressiona o sistema de saúde — mas também amplia o interesse por hábitos que preservem autonomia e qualidade de vida. Ao mesmo tempo, as corridas de rua seguem em expansão no país, com crescimento de provas e participação – é o que diz um levantamento realizado pela ABRACEO (Associação Brasileira dos Organizadores de Corrida de Rua e Esportes Outdoor), que aponta um aumento de 65% no número de corridas realizadas no país no primeiro semestre de 2025 em comparação com o mesmo período de 2024.
“Corrida na terceira idade traz inúmeros benefícios quando feita com segurança. É um excelente exercício para o coração e para o condicionamento físico, ajuda no controle de peso e ainda tem o ganho emocional de correr ao ar livre, em parques e praias”, afirma o geriatra Roni Mukamal — superintendente de Medicina Preventiva da MedSênior. “O ponto-chave é individualizar e respeitar limites”, ressalta o especialista.
Segundo orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) publicadas em 2020, adultos mais velhos devem somar 150 a 300 minutos semanais de atividade aeróbica moderada (ou 75 a 150 de vigorosa), incluir fortalecimento muscular em pelo menos dois dias e praticar exercícios de equilíbrio ao longo da semana. Para quem pretende correr, esses pilares são complementares e não opcionais.
Principais cuidados e orientações
Mukamal lembra que a corrida é de alto gasto calórico e trabalha intensamente a musculatura de membros inferiores, mas também aumenta o impacto em quadris, joelhos e tornozelos. “Para quem tem artrose mais avançada — especialmente de joelho — ou alguma condição cardíaca, vale discutir alternativas de menor impacto e, se indicado, treinos supervisionados”, explica, completando em seguida: “Para todos os demais, é possível correr, sim: com progressão gradual e alguns cuidados simples.”
Entre as recomendações práticas, o médico destaca: superfícies regulares (“evitar pisos irregulares e areia fofa, que sobrecarregam mais as articulações”), tênis bem ajustado e com bom amortecimento, e planejamento do ambiente (“fugir do calor intenso e não correr de estômago cheio”). Ele sugere, para iniciantes, o método de alternar caminhada e corrida nas primeiras semanas: “Comece com pequenos blocos, aumente aos poucos e pare se aparecer qualquer desconforto atípico.”
Corredores veteranos x novatos
Para quem já corre há muitos anos e entra na terceira idade com histórico esportivo, a transição costuma ser mais suave, desde que se ajuste volume e intensidade: “O veterano tem memória muscular e técnica, mas precisa preservar as reservas fisiológicas. Isso significa priorizar o fortalecimento de glúteos, quadríceps e core, alongar rotinas de recuperação e aceitar que ciclos precisam de mais dias fáceis. É preciso ter claro que a consistência vence o excesso.”
Já para quem começa a correr depois dos 60, o primeiro passo é avaliação clínica — checar pressão, controlar diabetes, rever medicações e, quando necessário, exames cardiológicos. “Com tudo em ordem, dá para iniciar com treinos curtos, supervisionados por profissional de educação física, e progressão semanal modesta. Muitas pessoas que começaram a correr na velhice se mantêm no esporte com prazer e propósito — e isso faz muita diferença na adesão”, diz o geriatra.
O especialista reforça ainda dois elementos frequentemente negligenciados: hidratação (“leve água quando o treino for mais longo”) e prazer. “Corra porque você gosta. Não é porque todo mundo corre que você precisa correr. Quando o exercício é prazeroso, ele cabe melhor na rotina — e vira hábito.”
De forma geral, evidências mostram que manter-se ativo na velhice reduz risco de doenças cardiovasculares, alguns tipos de câncer, declínio funcional e mortalidade. A corrida pode ser uma das formas mais acessíveis de atingir as metas semanais — desde que balanceada com força e equilíbrio, combinação que reduz queda e lesões em idosos.
Antes de apertar “start”, Mukamal deixa um roteiro final: “Avalie com seu médico, comece devagar e progredindo por semanas, não por dias, priorize piso regular e tênis adequado, intercale corrida e caminhada até o corpo ‘assentar’, faça fortalecimento duas vezes por semana, cuide da hidratação e, diante de dor ou mal-estar, interrompa e reavalie. Com esses cuidados, correr na terceira idade é não só possível como recomendável.”