
A cada ano, um número crescente de trabalhadores está sendo forçado a se afastar de suas atividades profissionais devido a transtornos mentais. A pressão constante por resultados, jornadas exaustivas e ambientes de trabalho estressantes têm levado a uma crescente exaustão emocional e física, afetando a saúde mental de milhares de pessoas.
Dados do Ministério da Previdência Social indicam que, entre janeiro e novembro de 2024, foram concedidos 439.620 benefícios por incapacidade devido a Transtornos Mentais e Comportamentais no Brasil, incluindo tanto benefícios temporários quanto aposentadorias. No Espírito Santo, 8.224 capixabas solicitaram afastamento do trabalho por questões de saúde mental no mesmo período.
O advogado especializado em direito do trabalho e previdenciário, Leonardo Ribeiro, explicou os principais desafios enfrentados pelos trabalhadores com transtornos mentais ao solicitar afastamento junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Segundo ele, “os transtornos mentais representam um desafio peculiar no âmbito previdenciário devido à dificuldade de comprovação objetiva da incapacidade laboral. O INSS muitas vezes adota critérios subjetivos, o que pode resultar no indeferimento do benefício, mesmo quando há laudos médicos consistentes”.
Ribeiro ressalta ainda que um advogado especializado pode ser fundamental para garantir o direito ao afastamento. “O advogado previdenciário atua na apresentação de documentos médicos robustos e no processo judicial ou administrativo para corrigir eventuais erros técnicos do INSS, garantindo que o segurado tenha acesso à proteção que lhe é devida”, afirmou.
Diferença no tratamento

Além disso, o advogado destacou a diferença no tratamento dado pela Previdência Social a afastamentos por doenças físicas e transtornos mentais. “Enquanto doenças físicas frequentemente possuem exames objetivos que facilitam a comprovação da incapacidade, os transtornos mentais são avaliados com maior subjetividade, o que pode resultar em indeferimentos desproporcionais e impactar negativamente a dignidade do trabalhador”, explicou.
O médico psiquiatra Gilson Giuberti Filho explicou os principais diagnósticos que levam ao afastamento por questões de saúde mental. “No âmbito ambulatorial, os afastamentos ocorrem majoritariamente por depressão, ansiedade ou uma combinação dos dois, em graus variados. O número de casos aumentou devido ao crescimento da população, mas a prevalência dos transtornos mentais continua a mesma”, afirmou.
Burnout entre as condições mais graves
Entre as condições mais graves está o burnout, que vai além do ambiente de trabalho, impactando a vida pessoal e social do indivíduo. “A exaustão física e emocional, a dificuldade de concentração, problemas de relacionamento e distúrbios do sono são apenas alguns dos sintomas. A longo prazo, o burnout pode evoluir para doenças graves como depressão, ansiedade e até afetar a saúde cardiovascular”, alertou o especialista.
O burnout é especialmente relacionado ao estresse no trabalho, causado por jornadas excessivas, falta de reconhecimento e ambientes tóxicos. “Quando o trabalhador é informado de que precisa retornar ao trabalho, o simples fato de antecipar o ambiente de pressão pode agravar seu quadro clínico”, destacou Giuberti.
A síndrome de burnout foi recentemente reconhecida como doença ocupacional pela Classificação Internacional de Doenças (CID), com a introdução do código QD85, a partir de 2025. Essa mudança, anunciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022, traz mais transparência para o tratamento da doença.
O levantamento do INSS revelou um aumento de 1.000% nos afastamentos por burnout entre 2014 e 2023, subindo de 41 para 421 casos anuais. A condição, caracterizada por sintomas como exaustão, despersonalização e sensação de incompetência, afeta diretamente a saúde do trabalhador e sua produtividade.

O psicólogo Gerson Abarca destacou que o burnout já é a principal causa de afastamento no Brasil, superando até mesmo transtornos como depressão e ansiedade. “Essa síndrome é um reflexo das condições de trabalho e, infelizmente, é cada vez mais comum entre os trabalhadores brasileiros”, disse Abarca.
Dicas para prevenção e tratamento
O doutor Marco Aurélio Bussacarini, especialista em Medicina Ocupacional pela Universidade de São Paulo (USP), e CEO fundador da Aventus Ocupacional — empresa que realiza gestão em saúde e segurança ocupacional, ressaltou que fatores como a competitividade no mercado de trabalho, a pressão nas redes sociais e a falta de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional têm contribuído para o aumento dos problemas de saúde mental no ambiente de trabalho. “A pressão constante por desempenho, aliada à dificuldade de se relacionar e à constante comparação nas redes sociais, gera uma combinação que resulta no aumento da ansiedade e do estresse”, afirmou Bussacarini.
Ele destacou ainda a importância de adotar práticas preventivas para evitar o desenvolvimento do burnout, como estabelecer limites claros entre o trabalho e o lazer, praticar exercícios físicos e garantir descanso adequado. “Essas medidas ajudam a reduzir a sobrecarga de trabalho e o estresse no dia a dia”, sugeriu.
O doutor Bussacarini também alertou para os sintomas do burnout, como cansaço contínuo, distanciamento das relações sociais, irritabilidade e baixa autoestima. “Esses sinais devem ser levados a sério. Um trabalhador que sofre com sobrecarga ou incertezas financeiras pode desenvolver problemas psíquicos e psiquiátricos que, se não tratados, podem piorar”, concluiu.
Estratégias para melhorar a saúde mental no ambiente de trabalho
Treinar lideranças e gestores para reconhecer sinais de alerta de saúde mental;
Criar um ambiente de suporte, desenvolvendo uma cultura organizacional que promova abertura e aceitação de discussões sobre saúde mental;
Oferecer acesso a serviços de saúde mental, como terapia e aconselhamento, por meio de Programas de Assistência ao Empregado (PAE);
Promover atividades de redução de estresse, como meditação, yoga e ginástica laboral;
Incluir o apoio psicológico nos planos de resposta a crises;
Criar e distribuir materiais informativos sobre saúde mental em e-mails, redes sociais e murais;
Oferecer treinamento em primeiros socorros psicológicos;
Criar espaços seguros para conversas abertas sobre saúde mental, sem julgamento;
Implementar pausas no trabalho e dias de folga para preservar a saúde mental;
Incentivar estilos de vida saudáveis por meio de desafios de bem-estar, seminários sobre nutrição e atividades físicas.
Fonte: Marco Aurélio Bussacarini, doutor e especialista em Medicina Ocupacional pela Universidade de São Paulo (USP) e CEO fundador da Aventus Ocupacional.