
A recente eleição para a Associação de Moradores de Jardim Camburi, o maior bairro de Vitória e um dos mais populosos do Espírito Santo, foi muito mais do que uma disputa comunitária. O que se viu ali foi a miniatura simbólica de uma mudança geracional e de um novo modo de fazer política. Um processo que, se corretamente interpretado, pode antecipar transformações profundas no cenário capixaba.
Todos os elementos de uma disputa institucional ampla estavam presentes: o envolvimento direto de forças estatais, o apoio declarado do prefeito Lorenzo Pasolini a uma das chapas, o engajamento de figuras políticas de peso — de esquerda e de direita — como os deputados João Coser, Capitão Assumção e Fabrício Gandini, e os bastidores tensos, embora curiosamente sem agressões explícitas. Mas o que se impôs ao fim do processo não foi o peso tradicional da máquina ou das figuras públicas: foi a autenticidade de uma nova geração de lideranças comunitárias.
Sob a liderança discreta e estratégica do vereador Maurício Leite, consolidou-se uma articulação que fugiu da polarização. Uma chapa com jovens, sim, mas com responsabilidade, vínculo com o território e disposição para construir, não para dividir. O resultado foi a vitória de Tercelino e Testinha — dois nomes que simbolizam não apenas juventude, mas preparo, maturidade e legitimidade orgânica junto à comunidade.
Esse processo eleitoral representa mais que um dado local. Ele se torna um fenômeno digno de análise porque expõe três camadas importantes da realidade política capixaba.
- A falência das frentes artificiais
Foi montada uma frente ampla para tentar conter esse novo grupo. Uma união de espectros políticos opostos, unificados não por ideais, mas por interesses conjunturais e estratégias de contenção de mudança. O fracasso dessa frente aponta para um esgotamento da lógica das alianças táticas descoladas da base social. - O declínio da política de gabinete
A tentativa de resolver a eleição em reuniões fechadas, em articulações de bastidor e com influência institucional direta não teve o efeito esperado. O eleitorado de base, mesmo em uma eleição comunitária, mostrou discernimento para identificar quando está sendo instrumentalizado. E preferiu quem fala sua língua, vive seus problemas e compartilha de sua realidade. - O surgimento de uma renovação madura
Renovar não é apenas trocar nomes. É mudar as práticas, os propósitos e as formas de se relacionar com o poder. A chapa vitoriosa em Jardim Camburi conseguiu algo raro: representar renovação sem irresponsabilidade, juventude sem imaturidade, engajamento sem radicalismo. Isso é um sinal claro de que há espaço — e necessidade — para um novo ciclo político no Espírito Santo.
Essa eleição, silenciosa para muitos, grita para quem sabe escutar os sinais da mudança. Não houve escândalos, não houve espetáculo midiático, não houve clima de guerra. Houve organização, respeito e vitória pela via legítima. Isso, em tempos de tensão institucional, é revolucionário.
É hora dos partidos, movimentos sociais e lideranças públicas entenderem que as transformações do século XXI não serão comandadas por velhas estruturas maquiadas com discursos de ocasião. A política que vai emergir precisa ser horizontal, enraizada, empática — e profundamente ligada às dores e esperanças reais das comunidades.
Jardim Camburi, mais uma vez, saiu na frente. Mas não como vitrine de consumo ou de infraestrutura — e sim como sinal de que a renovação já começou. E agora, cabe aos que venceram apresentar as soluções. A comunidade observou, escolheu e confiou. A responsabilidade agora é devolver isso em gestão, escuta e resultados.
Se os líderes capixabas forem sábios, saberão olhar esse processo como uma lente. Não para manipular — mas para compreender. Porque o Espírito Santo está mudando. E, com ele, seu povo também.