Mulher é vítima de stalking após denunciar estupros de 'montador de móveis'

A vítima diz estar sendo perseguida e ameaçada há mais de três meses e relata uma nova violência sexual meses após o primeiro crime

Foto: ilustrativa -

Depois de ser violentada duas vezes por um homem que não conhecia, e afirmar estar sendo perseguida e ameaçada, Ana* – nome fictício – teve a vida completamente transformada. “Mudei de casa, troquei de curso, de número. Vivo na casa de outras pessoas porque, sozinha, me sinto muito vulnerável. Sinto muito medo”, contou a jovem de 24 anos, em entrevista a O TEMPO.

Ela denuncia ter sido vítima de estupro, perseguição e ameaça de morte após contratar um montador de móveis pela internet. Mesmo após o primeiro ataque, ocorrido no dia da prestação do serviço, Ana* afirma que o suspeito seguiu em liberdade, o que permitiu que ele a violentasse novamente.

O terror começou em 30 de março, quando ela contratou o homem por meio de um anúncio no Facebook para montar um guarda-roupa. No dia seguinte, ele foi até sua casa. Após terminar o serviço e receber o pagamento, pediu um copo d’água. “A sala era conjugada com a cozinha. Fui pegar a água e, quando me virei, ele já estava atrás de mim, com uma faca da minha cozinha”, relembra. Segundo o boletim de ocorrência registrado por Ana*, “o autor conduziu a vítima para o quarto e manteve relação sexual não consentida”.

O trauma foi tão grande que Ana* só procurou ajuda três dias depois. “Eu estava com vergonha, me sentindo culpada. Só no terceiro dia consegui contar para alguém, que pensou em tudo e me levou ao hospital.” Ela foi atendida no Hospital das Clínicas da UFMG, onde recebeu orientações, iniciou a prevenção contra doenças e gravidez e teve material genético coletado.

Quatro dias após o estupro, o suspeito passou a persegui-la por mensagens. Ele entrou em contato usando diversos números. O TEMPO teve acesso aos registros. Nas mensagens, ele dizia estar em frente à casa dela, perguntava se havia mais móveis para montar e escrevia frases com teor sexual como “Você é muito gostos*”.

Onze dias após o ataque, Ana* registrou a primeira denúncia na Delegacia de Plantão de Atendimento à Mulher. Ela afirma que, a partir daí, passou a ser seguida também presencialmente. O homem estaria próximo à sua casa e ao cursinho que frequentava, acompanhando sua rotina.

Ela diz ter recebido mensagens de ao menos oito números diferentes, incluindo ameaças para retirar a queixa. “Você tem 24 horas, está avisada”, “Sugiro que tome cuidado daqui em diante”, “Você vai pagar”, “Você não me escutou, então sofra as consequências”, mostram os prints.

Prints mostram as mensagens enviadas pelo suspeito à vítima. (Foto – Arquivo pessoal) 

Tentativa de emboscada

No dia 17 de maio, Ana* recebeu uma ligação que acredita ter sido uma tentativa de emboscada. “[…] recebeu ligações com informações falsas sobre o comparecimento em uma delegacia inexistente”, registra o boletim.

Ana* afirma que quase foi ao endereço, mas foi alertada por sua rede de apoio a não ir. “Eu não reconhecia a voz dele, porque eu não sei se era a voz dele mesmo, ou se era uma terceira pessoa”, conta. Ela acredita que, se tivesse ido, o pior aconteceria. “Acho que ele teria me estuprado novamente, ou me matado”. 

Uma nova agressão 

No dia 2 de junho, Ana* teria sido foi novamente surpreendida e violentada sexualmente. Ao sair do cursinho, no Centro da cidade, ela foi abordada pelo suspeito, que a segurou pelo braço e a arrastou, mesmo com ela chorando e pedindo ajuda. Ana* conta que foi levada até uma rua próxima, onde ele chamou um carro de aplicativo. “Foi mantida sob ameaça e sofrendo nova violência sexual”, relata o boletim. Testemunhas teriam presenciado a cena, mas não interferiram. No mesmo dia, procurou novamente atendimento médico, onde passou a noite e a madrugada, e no dia seguinte voltou à delegacia.

A vítima diz não saber se o suspeito está sendo investigado ou se há medidas para prendê-lo, mesmo após ter sido chamada algumas vezes na delegacia para entregar provas. “Fico com tanta raiva… Parece que estou fazendo algo errado. Denúncia, depoimento, exames, provas… nada é suficiente.”

Ela afirma que tudo que tem vivido, tem sido devastador. “É algo que te muda para sempre. Larguei os estudos porque não consigo mais me concentrar. Ter vida social é fora de cogitação. Penso que ele pode aparecer a qualquer momento.” Mesmo no trabalho, Ana* diz que só comparece por medo de perder o emprego. “Vou arrastada. Mas volto de carro de aplicativo”., conta. 

Ana* destaca ainda que sua saúde mental está severamente afetada. Em alguns momentos, ela pensou em tirar a própria vida. Hoje faz acompanhamento psiquiátrico e psicológico três vezes por semana, além do uso de medicamentos. “Eu estou sobrevivendo. Não tenho a mínima vontade de viver. Sinceramente, se não fosse a vigilância da minha rede de apoio, eu não estaria mais aqui.”

O que diz a Polícia Civil

Neste domingo, a reportagem entrou em contato com a Polícia Civil para saber se o suspeito foi localizado e se houve a abertura de inquérito. Por e-mail, a corporação informou que, em razão do regime de plantão, não haveria atualizações sobre o caso e que uma nova tentativa de contato deve ser feita em dia útil.

Suspeito não atende

A reportagem tentou contato com dois números usados pelo suspeito para se comunicar com a vítima, a fim de apurar sua versão dos fatos. Nenhuma das ligações foi atendida.

FONTE: O TEMPO