Real é a moeda que mais valoriza no mundo. Por que e até quando?

Entre 9 de julho e 8 de agosto, o dinheiro brasileiro avançou mais em relação ao dólar do que outras 26 divisas globais

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O real foi a moeda que apresentou maior valorização frente ao dólar no mundo, no período entre 9 de julho e 8 de agosto. É isso o que mostra uma análise da consultoria Elos Ayta, que comparou o desempenho do dinheiro brasileiro com outras 26 divisas globais.

Na lista, o real ocupa o primeiro lugar com uma elevação de 0,69% nesse período. A seguir, vem o sol, do Peru, com 0,56%. Em terceiro lugar, está o rand sul–africano, com 0,51% e, em quarto, o peso mexicano, com 0,12%.

Só essas quatro moedas valorizaram-se em relação ao dólar no período avaliado. Outras quatro divisas permaneceram estáveis. O que significa que o restante, 19 no total, perderam para a moeda americana.

O último lugar da lista é ocupado pelo peso argentino. No caso, ele desvalorizou 5,49% na comparação com a moeda americana (veja quadro abaixo). As variações consideram a cotação do dólar Ptax, calculado pelo Banco Central (BC).

Por quê?

As perguntas são: por que o real está no topo da lista e, de quebra, até quando vai ocupar essa região? Para analistas e economistas, há questões pontuais que têm favorecido a valorização da moeda brasileira. Uma delas é a elevada taxa básica de juros do país, a Selic.

Fixada em 15% ao ano, observam os especialistas, a Selic atua como fonte de atração de investidores, fomentando um movimento conhecido no mercado como carry trade. No caso, trata-se de uma estratégia na qual os investidores tomam empréstimos em uma moeda com juros baixos e investem esses recursos em uma moeda com juros altos (no caso, o Brasil).

Ingresso de dólares

“A taxa real de juros do Brasil é a segunda maior do mundo (só perde para a Turquia)”, diz Rafael Krakhche, do escritório de investimentos Fami Capital. “Isso faz com que entre mais dólares no Brasil, o que valoriza o real em relação à moeda americana.”

Márcio Holland, professor na Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP), observa que, nos últimos meses, o “cenário para os juros domésticos e os estrangeiros ficaram relativamente menos incertos”. “E está cada vez mais clara a alta diferença entre a Selic e a Fed fund”, diz, citando as taxas de juros dos fundos federais dos EUA. “Mais do que isso, essa diferença deve se manter por um tempo prolongado. Com isso, o Brasil ganhou um pouco mais de atratividade.”

Ambiente global incerto

Holland acrescenta que, mesmo que a situação fiscal (dada pela relação entre gastos e receitas do governo federal) “esteja preocupante”, as surpresas de crescimento econômico, no mercado de trabalho e na arrecadação tributária do Brasil “mostram uma economia resiliente a juros altos”.

Além disso, diz o professor da FGV EESP, o ambiente econômico global tornou-se mais incerto com a gestão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “E o Brasil não parece tão ruim neste cenário, mesmo com seus desafios”, afirma.

Ele nota que, prova disso, é o CDS (Credit Default Swap) de 5 anos do Brasil, que caiu de 170 pontos para 137 pontos. “O CDS mede o prêmio de risco do país”, diz. “Quando cai é porque os investidores avaliam que o risco do Brasil diminuiu.”

Fator político

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, concorda que “condicionantes domésticos” estão atuando a favor da valorização do real frente ao dólar. Além das taxas de juros, ele destaca “ativos importantes de exportação” da economia brasileira, que também contribuem para a entrada de dólares no país.

Vale, contudo, acredita que fatores políticos também estejam atuando nesse caso. “Existe um cenário de enfraquecimento do presidente Lula”, diz, referindo-se a pesquisas eleitorais recém-divulgadas. “O mercado está incorporando a ideia de que a direita vai ganhar as eleições presidenciais no ano que vem e ‘está tudo resolvido’.”

Até onde?

Até onde vai a valorização do real, observam os especialistas, é difícil prever. “O“cenário está muito incerto para qualquer projeção para o câmbio”, diz Holland, da FGV. Consideradas as previsões do Boletim Focus, a pesquisa semanal feita com economistas do mercado pelo Banco Central (BC), o dólar deve chegar ao fim do ano cotado a R$ 5,60. Há um mês, essa estimativa era de R$ 5,65.

Nos pregões diários, o comportamento do dólar tem oscilado bastante, principalmente com o noticiário sobre eventuais cortes nos juros dos EUA, fixada no intervalo entre 4,25% e 4,50%. Cresce entre analistas, a estimativa de uma redução de 0,25 ponto percentual da taxa já em setembro, na próxima reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), do Federal Reserve (Fed, o banco central americano).

O eventual corte aumentaria o que os técnicos chamam de “diferencial de juros” a favor do Brasil, algo que, em tese, atrairia maior número de investidores, até mesmo para o mercado de capitais. Isso porque ativos de risco, como as ações negociadas em bolsas, também se tornam mais atrativas num cenário de queda de juros nos EUA.

Rankings sobre moedas também são suscetíveis a mudanças rápidas. Dependendo do período analisado, eles podem mudar com facilidade. O fato é que o real tem permanecido entre as maiores valorizações frente ao dólar em seguidos levantamentos.

Moedas que se valorizaram em relação ao dólar (em %) *

  • Real – Brasil + 0,69
  • Rand sul-africano + 0,56
  • Sol – Peru + 0,51
  • Peso mexicano + 0,12

Moedas que empataram com o dólar

  • Dólar australiano 0,00
  • Yuan – China 0,00
  • Dólar de Hong Kong 0,00
  • Libra esterlina – Inglaterra 0,0

Moedas que desvalorizaram frente ao dólar (em %)

  • Rúpia Indonésia  – 0,03
  • Rial – Arábia Saudita – 0,05
  • Peso Filipino – 0,32
  • Coroa dinamarquesa – 0,62
  • Coroa sueca – 0,63
  • Dólar canadense – 0,72
  • Iene – Japão – 0,91
  • Peso colombiano – 0,95
  • Euro – Zona do euro – 1,16
  • Won – Coreia do Sul – 1,17
  • Franco suíço – 1,23
  • Lira turca – 1,60
  • Coroa norueguesa – 1,85
  • Rúpia – Índia – 2,11
  • Dólar taiwanês – 2,18
  • Rublo – Rússia – 2,40
  • Peso chileno – 2,73
  • Novo shekel – Israel – 2,92
  • Peso argentino – 5,49

Fonte: Elos Ayta (para período entre 9 de julho e 8 de agosto, com dólar Ptax)

FONTE: METROPOLES