Os impactos do desacordo Vale-Governo sobre a ferrovia do Norte do ES

Impasse entre governo federal e Vale trava investimentos ferroviários, afeta projetos no Espírito Santo e gera insatisfação do governador Renato Casagrande.

O fato da semana na economia capixaba é o “pra trás” da Vale no acordo de renovação de suas concessões ferroviárias e os investimentos que deveria fazer em função disso. Se o desacordo impacta o contrato, pior ainda para aquilo que não era obrigação contratual, como o investimento nos 80km da EF 118, entre Santa Leopoldina e Ubu. Essa última parte deixou mal humorado o governador Renato Casagrande (ES).

Afinal, a Vale entregou, dia 3 de julho de 2024, ao Governo, em solenidade no Palácio Anchieta, o projeto básico de engenharia do sonhado trecho feerroviário do Governo de Casagrande, ligando a Estrada de Ferro Vitória-Minas ao Porto de Ubu. Porém, até o  momento não avançou no projeto, que sequer tem Declaração de Utilidade de Pública (DUP), que permite a desapropriação de terras por interesse federal.

A agência Infra noticiou que diferenças inconciliáveis entre o Governo Federal e a Vale frustraram a tentativa de um acordo bilionário de repactuação dos contratos de concessão das ferrovias Vitória-Minas e Carajás, que foram renovados pelo governo passado até 2057 e viraram objeto de disputa na atual gestão, insatisfeita com as bases e os valores do negócio fechado em 2020.

Após um início de discussões tumultuado em 2023, o governo e a mineradora acertaram ano passado ir à SecexConsenso do TCU (Tribunal de Contas da União) para repactuar os contratos. As tratativas aconteciam desde março deste ano, mas terminaram nesta quinta-feira (28) sem solução.

Além da repercussão para as duas ferrovias operadas pela Vale – com indicativo de que o assunto pode parar na Justiça –, a falta de consenso traz implicações em cascata para o programa ferroviário do governo Lula, cujo sonho de ligar por ferrovia o porto de Ilhéus à fronteira do Brasil com o Peru começa a fazer água.

Viria desta repactuação a maior parcela de recursos para preencher o que é classificado como “gap” de viabilidade de novas concessões de ferrovias, muito caras para o setor privado entrar sem ajuda do estado. O Ministério dos Transportes esperava mais R$ 7 bilhões nesse acordo com a Vale, além dos R$ 4 bilhões que já haviam sido antecipados pela mineradora, mas tinham caído direto na conta do Tesouro no fim de 2024.

FICO-FIOL

Os impactos imediatos se concentram no projeto de concessão do corredor Fico-Fiol. Pelo que havia sido projetado até o momento, a Vale seria, em três frentes, peça-chave para viabilizar a concessão da ferrovia planejada para carregar a produção agrícola do Mato Grosso ao litoral de Ilhéus, na Bahia.

Além de o dinheiro da repactuação eventualmente ser usado numa conta vinculada da futura concessão, o projeto programado para ir a leilão no próximo ano depende da Vale também porque é dela a responsabilidade de executar, como contrapartida pela renovação, o trecho 1 da Fico (Ferrovia de Integração Centro-Oeste), Mara Rosa (GO) e Água Boa (MT), livrando o futuro operador desse investimento, calculado orçamentariamente em R$ 2,7 bilhões.

Essa obrigação, negociada na renovação de 2020, continua prevista para execução pela Vale. Mas as tratativas frustradas da repactuação mostraram que há um problema com o empreendimento. Segundo fontes, um dos motivos que impediram o acordo no TCU foi a Vale ter tentado sair da execução das obras de 80 quilômetros da Fico por entender que os prazos previstos não poderão ser cumpridos por exigências ambientais. Se o trecho não for garantido, a concessão do corredor Fico-Fiol ganha mais um fator de incerteza.

Além disso, o governo apostava suas fichas na mineradora para resolver o atual problema com a Fiol 1, concedida para conectar Ilhéus (BA) e Caetité (BA) e também essencial para manter a Fico-Fiol de pé, mas abandonada pela Bamin, que arrematou o ativo num leilão em 2021.

Como mostrou a Agência iNFRA, a Vale e o governo conversavam para tentar encontrar um operador para o novo porto de Ilhéus e assim convencer a mineradora a assumir a Fiol 1. Mas, sem consenso nas repactuações da EFC (Estrada de Ferro Carajás) e EFVM (Estrada de Ferro Vitória a Minas), a solução fica mais improvável.

PETROCITY

Longe dessa briga, o Grupo Petrocity continua avançando com o projeto de sua malha ligando São Mateus, no Norte do Espírito Santo, a Barra de São Francisco e, daí, a Brasília (DF) e Mara Rosa (GO), onde passa a Ferrovia Norte-Sul (Itaqui-MA ao porto de Santos-SP).

“Avançamos com as ferrovias e também com o projeto do porto de Urussuquara. Está tudo dentro do cronograma. As desapropriações feitas por meio das DUPs (Declarações de Utilidade Pública) federais para os quatro trechos (São Mateus-Santana do Paraíso-MG, Barra de São Francisco-Brasília, Brasília-Mara Rosa e Corumbá de Goiás-Anápolis) e o pessoal em campo no trabalho de licenciamento ambiental. Logo começaremos o processo de indenizações por onde passará o leito das ferrovias”, disse o presidente da Petrocity, José Roberto Barbosa, sem entrar na questão do Governo Federal com a Vale.

Apenas complementando que “as ferrovias da Petrocity são a melhor alternativa para ligar os portos capixabas ao Centro-Oeste do País”. Diferente das ferrovias operadoas pela  Vale, que são concessões renovadas a cada 25 anos mediante pagamentos à União, as ferrovias da Petrocity são autorizadas, construídas com recursos privados, e cujos contratos de autorização têm validade de 99 anos. (Da Redação com informações da Agência Infra e A Gazeta)

Veja reportagem completa da Agência Infra sobre o problema da Vale com o Governo Federal: https://agenciainfra.com/blog/divergencias-entre-governo-e-vale-brecam-acordo-sobre-ferrovias/