Médica teria deixado amiga em coma após aplicação caseira de remédio restrito

Letícia de Souza, de 31, está em coma vigil desde setembro, quando recebeu a medicação na casa da amiga, a anestesista Natália Peixoto de Azevedo Kalil

Letícia de Souza Patrus Pena, de 31 anos, está no estado conhecido como "coma vigil" desde setembro Foto: ARQUIVO PESSOL/DIVULGAÇÃO -

É investigada pelo Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG) uma denúncia feita pela família da engenheira de produção Letícia de Souza Patrus Pena, de 31 anos, que está internada há cinco meses em estado de semiconsciência (coma vigil), após sofrer uma parada cardiorrespiratória e graves lesões cerebrais durante a aplicação de um medicamento anestésico por uma amiga médica. O caso ocorreu em setembro de 2024, na residência da anestesista Natália Peixoto de Azevedo Kalil, em Belo Horizonte. A especialista fez o uso caseiro de cloridrato de ropivacaína, um anestésico de longa duração que tem o uso restrito para ambientes hospitalares.

“A Letícia sofria com uma dor muito forte na coluna. Ela chegou, inclusive, a fazer uma cirurgia de hérnia, e melhorou. Só que o problema retornou, e a Letícia comentou sobre isso com a Natália, que é uma amiga de infância dela. Elas fizeram um bloqueio anestésico em agosto, onde tudo ocorreu bem, e este segundo, em setembro, quando ela teve a parada cardiorrespiratória”, conta a mãe de Letícia, a servidora pública Flávia Bicalho de Souza, de 55 anos. De acordo com Flávia, a segunda aplicação foi realizada sem um preparo prévio. “Não pediu para ela fazer jejum ou qualquer outro tipo de preparação”, acrescenta.

Ainda de acordo com a mãe de Letícia, a filha teve convulsões e vomitou logo após a aplicação do medicamento. “A Letícia não imaginava que tinha riscos, ela conhecia e confiava na Natália. Só que esse medicamento nunca poderia estar na casa dela. É algo que não pode sair do hospital ou clínica porque precisa ser aplicado em local que tenha aqueles equipamentos de suporte à vida”, diz.

Flávia também denuncia que a anestesista teria negado socorro imediato à sua filha. “A Letícia teve uma parada cardiorrespiratória e, ao invés de ligar para o Samu, a Natália ligou para o marido para chamar o irmão dele, que é um ortopedista. Só depois eles colocaram ela em um carro comum para socorrê-la ao hospital, sem qualquer condição adequada”, detalha a mãe.

Apesar do socorro, Letícia chegou à unidade de saúde já com lesões cerebrais. Segundo a família, ela precisou ser reanimada pela equipe médica e, desde então, se encontra no estado de semiconsciência.

“Foi uma lesão cerebral complicada. A Letícia chegou ao hospital totalmente parada. Ela está sem comunicar, não se movimenta, tem crises de ansiedade muito fortes. Hoje a gente precisa trocar a roupa de cama umas quatro vezes ao dia”, relata. Flávia afirma que só soube do ocorrido com a sua filha quando ela já havia sido socorrida para o hospital. “No começo eu até acreditava que a Letícia tinha salvo a vida da minha filha, mas não. Foi uma série de erros”, desabafa Flávia.

Família já gastou R$ 500 mil com tratamento

Ainda segundo a mãe da engenheira, desde o ocorrido Letícia permanece internada e, nesse período, a família já desembolsou cerca de R$ 500 mil para custear o tratamento. “Nós procuramos um advogado e tentamos mostrar para Natália o que a gente estava gastando, mas ela não quis nem ver”, conta Flávia. A família denunciou o ocorrido no CRM-MG. Por nota, o órgão informou que “todos os procedimentos abertos correm sob sigilo, conforme previsto no Código de Processo Ético-Profissional”. No site do conselho, o registro da médica continua como regular. 

Uma denúncia também foi feita junto ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). No entanto, conforme o órgão de Justiça, ainda não foi instaurado um procedimento devido à troca de promotores. O órgão informou, porém, que a nova promotora irá “analisar as informações recebidas para definir as medidas cabíveis”.

O TEMPO tentou contato com a anestesista Natália Peixoto de Azevedo Kalil, mas, até a publicação desta reportagem, ela ainda não tinha se manifestado. 

FONTE: O TEMPO