O Brasil atravessa uma mudança profunda no seu mapa demográfico. Depois de três anos de alta, o número de divórcios recuou 2,8% entre 2023 e 2024, somando 428.301 dissoluções. O dado, divulgado pelo IBGE, confirma que a curva é cíclica, mas ainda não revela nova tendência. Já a natalidade vive um cenário oposto: queda acelerada, estrutural e historicamente inédita.
DIVÓRCIOS: QUEDA PONTUAL, MAS FAMÍLIA EM TRANSFORMAÇÃO
O país registrou sua primeira redução de divórcios desde 2020. Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e Sul puxaram a queda, enquanto o Norte destoou com alta de 9,1%.
Mesmo sem bruscas mudanças, a estrutura familiar segue em reconfiguração acelerada.
Pela primeira vez, a guarda compartilhada ultrapassou a guarda materna: 44,6% contra 42,6%. Há dez anos, a vantagem da guarda com a mãe era avassaladora: 85,1%. A virada é efeito direto da Lei 13.058/2014, que prioriza a corresponsabilidade parental.
Além disso, 81,8% das dissoluções ocorreram pela via judicial. A maioria envolve casais com filhos menores — pouco mais de 45% dos casos. O tempo médio até o divórcio permanece estável em 13,8 anos.
CASAMENTOS: RECUPERAÇÃO LENTA E NOVOS PADRÕES
Os casamentos civis cresceram 0,9% em 2024, totalizando 948.925 registros. Ainda assim, o país não retomou o patamar pré-pandemia. A reação é desigual: o Nordeste foi a única região com queda.
Casamentos entre pessoas do mesmo sexo alcançaram um recorde histórico: 12.187 registros, alta de 8,8%. Casais femininos lideraram o movimento, respondendo por 64,6% das uniões.
A idade média para casar segue aumentando. Homens solteiros se casam aos 31,5 anos, mulheres aos 29,3. O avanço da expectativa de vida e o boom dos recasamentos elevou a participação de uniões envolvendo divorciados e viúvos para 31,1% — mais que o dobro de 2004.
BRASIL TEM O PIOR CENÁRIO DE NATALIDADE EM 50 ANOS
A queda de nascimentos é, hoje, o dado mais disruptivo do conjunto. De 2023 para 2024, o recuo foi de 5,8%: 2,52 milhões para 2,38 milhões de bebês. É o sexto ano consecutivo de baixa — algo jamais visto desde 1974.
A redução atinge todas as regiões, com maior intensidade no Sudeste (-6,3%), Norte (-6,2%) e Sul (-6,0%). Acre, Rondônia e Piauí lideram os recuos.
A maternidade jovem despenca. Em 2004, mais da metade das mães tinha até 24 anos (51,7%). Em 2024, o índice caiu para 34,6%. Entre adolescentes, a redução também é marcante: de 20,8% para 11,3% em vinte anos — ainda assim, são 267 mil nascimentos de mães com até 19 anos.
Outro dado relevante é o aumento de mães estrangeiras no país: 22.290 registros, principalmente de venezuelanas, bolivianas e paraguaias.
ÓBITOS CRESCEM E SOBREMORTALIDADE MASCULINA SEGUE DRAMÁTICA
O país registrou 1,50 milhão de óbitos em 2024, alta de 4,6%. Idosos representam 71,7% dessas mortes. Todas as regiões aumentaram seus índices, com destaque para Centro-Oeste e Sul.
Causas externas ainda reforçam a desigualdade entre homens e mulheres. Entre os óbitos não naturais, 85.244 eram homens, contra 18.043 mulheres — proporção 4,7 vezes maior. Entre jovens de 15 a 29 anos, a diferença explode: 7,7 vezes mais mortes masculinas.
A violência, os acidentes e o padrão cultural de risco seguem pesando sobre a juventude masculina brasileira.
O QUE ESSES DADOS REVELAM SOBRE O PAÍS
Os números apontam uma convergência de fenômenos:
1. A família brasileira está se reconfigurando.
Mais divórcios em ciclos regulares, mais recasamentos, mais casais do mesmo sexo e guarda compartilhada como nova regra.
2. O país vive um inverno demográfico.
A natalidade está caindo rápido demais. O impacto futuro inclui dificuldade para repor força de trabalho, desafios previdenciários e mudanças profundas no mercado.
3. A violência mata homens jovens em ritmo insustentável.
A sobremortalidade masculina é um alerta estrutural de saúde pública, segurança e desigualdade.
4. A transição social está acelerada.
Casar mais tarde, ter menos filhos e se divorciar mais cedo são marcas do novo desenho brasileiro.
