
O debate sobre o pó preto na Grande Vitória ganhou um toque inusitado durante a reunião da Comissão de Proteção ao Meio Ambiente da Assembleia Legislativa (Ales), presidida pelo deputado Fabrício Gandini (PSD). Em meio às discussões sobre tecnologia e transparência no controle da poluição, uma revelação curiosa arrancou risadas e espanto: o cocô de um canarinho está invalidando medições da qualidade do ar em Vitória.
O caso foi relatado pelo coordenador de Qualidade do Ar e Áreas Contaminadas do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), Vinícius Rocha Silva, ao ser questionado sobre as limitações do modelo manual de monitoramento, após uma amostra ter sido classificada como inconclusiva.
“O monitoramento manual é muito suscetível a interferências externas. No caso do Clube Ítalo, em Vitória, temos enfrentado um problema específico: um canário pousa no coletor e o cocô dele acaba contaminando a amostra. Isso interfere no resultado e inviabiliza o uso dos dados”, explicou o técnico, em meio a risadas dos parlamentares e convidados.
A estação fica próxima ao Clube Ítalo Brasileiro, voltada para a Ponta de Tubarão, área com registros recorrentes de reclamações sobre o pó preto. Segundo o coordenador, o problema vem ocorrendo há cerca de um ano e, em julho, uma coleta precisou ser descartada.
O Iema já estuda, com o setor de fauna, alternativas para afastar o passarinho sem comprometer o funcionamento da estação.
“É um ponto estratégico para o monitoramento da poluição, e não podemos simplesmente desativar. Estamos avaliando soluções que afastem as aves sem interferir na coleta”, acrescentou Vinícius.
Mas o episódio do “canário sabotador” não é o único exemplo das dificuldades enfrentadas pela rede de monitoramento. O coordenador contou que, em Carapebus, na Serra, uma estação precisou ser desativada depois que uma escola decidiu construir um telhado ao lado do equipamento, o que inviabilizou a coleta.
“Foi uma situação inusitada também. A estação ficava dentro de uma escola e a direção resolveu cobrir parte do pátio. A obra do novo telhado passou a interferir diretamente na amostragem, e tivemos que encerrar o monitoramento naquele ponto”, contou Vinícius.
Para o deputado Fabrício Gandini, os dois episódios — o do canário e o da escola — reforçam a necessidade urgente de modernização do sistema.
“É quase inacreditável imaginar que um passarinho ou uma obra escolar possam interferir na medição da qualidade do ar. Mas isso mostra como o modelo manual é vulnerável e reforça a importância do novo monitoramento eletrônico, que vai garantir dados mais precisos”, destacou o parlamentar.

O novo sistema, que será implantado a partir de um acordo de cooperação entre o governo do Estado e as empresas poluidoras, tem assinatura prevista para o dia 28 deste mês. Ele permitirá medições automáticas, ampliará a transparência e trará mais agilidade para a fiscalização ambiental.
De acordo com o Iema, o investimento será custeado pelas próprias empresas, sem custo para o Estado, e o início das medições automáticas deve ocorrer nos próximos meses, após a chegada e calibração dos equipamentos.
Atualmente, a Grande Vitória conta com oito estações de monitoramento: Laranjeiras e ArcelorMittal Carapina (Serra); Jardim Camburi, na Enseada do Suá, Vitória-Centro (Ministério da Fazenda) (Vitória); ArcelorMittal Continental, Vila Capixaba (Ceasa) e Ibes (Vila Velha).
A meta é chegar a 13 estações até o fim do próximo ano, consolidando a rede mais densa de monitoramento do país.
AVANÇOS
O deputado Gandini ressaltou também que o governo estadual está avançando em outras frentes, como o inventário das fontes emissoras e o estudo do DNA do pó preto, que permitirá identificar com precisão a origem das partículas.
“Estamos em um momento importante para a sociedade. Com tecnologia e transparência, vamos descobrir de onde vem a poluição e agir com justiça e eficiência. O cidadão precisa saber, de forma simples, se o ar que respira está bom ou ruim”, destacou Gandini.
O parlamentar anunciou ainda que a Comissão de Meio Ambiente vai promover uma audiência pública para aprofundar o debate.
“Casos como o do canário e o da escola mostram que o controle da poluição é um desafio técnico e humano. Mas com fiscalização, transparência e investimento em tecnologia, vamos seguir avançando. Afinal, estamos falando da saúde da população”, concluiu Gandini.