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No Brasil, a média das pessoas passa mais da metade do tempo em que estão acordadas de frente às telas. No total, são 9 horas e 13 minutos de visualização por dia – nada menos que 54,7% do período desperto encarando um computador ou smartphone.
Os números, medidos pela plataforma Eletronics Hub, colocam o país no segundo lugar de um ranking que comparou o tempo gasto diante das telas por populações de 45 nações. Os brasileiros, segundo o levantamento, ficaram atrás apenas dos sul-africanos, que somam uma média diária de 9 horas e 24 minutos, um percentual de 56,8% do tempo acordado. Globalmente, os índices são mais modestos, chegando a 6 horas e 43 minutos dedicados ao uso de um computador ou smartphone.
E boa parte de todo esse tempo de tela é certamente dedicado ao consumo de conteúdos de influenciadores digitais, cujo mercado, em ao menos uma plataforma, o Brasil lidera. É o que aponta a Nielsen, empresa de informação e medição que desenvolveu um estudo sobre o tema, concluindo que o país acumula o maior número de influencers no Instagram, com mais de 10,5 milhões de perfis com aproximadamente mil seguidores cada, além de cerca de 500 mil criadores de conteúdo com mais de 10 mil seguidores. No YouTube e no TikTok, seguimos no pódio, alcançando a terceira posição do ranking global.
Os dados reforçam a ideia de que o Brasil se apresenta como um terreno fértil para o mercado de influenciadores. Mas, por outro lado, também fazem acender o alerta sobre uma possível saturação desse ecossistema, fazendo que alguns se questionem se há espaço para tanta gente nesse grande armazém da economia da atenção, onde as redes sociais operam.
Para Ettore Stefani de Medeiros, profissional de comunicação digital e professor universitário, ao falar do fascínio dos brasileiros com os influenciadores, é preciso se ater a uma série de fatores. “Para começar, temos que pensar que o Brasil é um país um dos maiores países do mundo, então, claro, temos muitas pessoas com potencial para produzir conteúdo e também para ser consumidor dessas criações”, aponta. Além disso, ele aponta um fator cultural, com raiz histórica: “Antes mesmo das redes sociais se tornarem proeminentes, a gente já tinha um consumo de celebridades, que já apontava para esse interesse nacional pela vida das pessoas que, de alguma maneira, estão em algum lugar de destaque”, pontua.
Evidentemente, também entra na conta o alto índice de consumo de tela, sobretudo das redes sociais – neste quesito, mais uma vez, o país fica atrás apenas da África do Sul, segundo a apuração da Eletronics Hub. Por fim, Medeiros sugere que o contexto de insegurança socioeconômica pode ser outro fator a ser considerado. “Somos uma nação formada por pessoas habituadas à ideia de ‘dar um jeito’, pessoas que passam por dificuldades e precisam se virar, vendo, nesse mercado, uma possibilidade para ter uma renda extra e, quem sabe, ascender socialmente”, argumenta, inteirando que a pandemia entra na equação ao acentuar um processo de “virtualização” das relações, sejam elas pessoais, profissionais, comerciais ou até afetivas.
Ainda há espaço para mais influenciadores?
Há, na leitura de Ettore Medeiros, um contexto que ajuda a compreender a popularização dos influenciadores no país, envolvendo hábitos, questões socioeconômicas e até o que parece um fascínio nacional já histórico pela vida dos famosos. Mas, mesmo em um cenário que parece tão promissor para o desenvolvimento deste mercado, ainda parece difícil que um número tão grande de atores seja absorvido. “Acredito que estamos passando por uma saturação de um tipo de mercado de influencers: o que não aderiu a uma lógica mais avançada, a uma profissionalização”, sugere o profissional da comunicação.
“Hoje, levando em conta que algumas marcas estão repensando se vale mesmo a pena investir em influenciadores, em celebridades ou em outros canais, acredito que esse influenciador que não entende que está exercendo uma profissão tende a perder espaço”, assinala. “Por outro lado, não vejo essa saturação no caso daqueles que compreendem que precisam se profissionalizar, ter um modelo de negócios, uma estratégia de gestão, que entendem sobre seu público, que sabem que precisam identificar se há uma sinergia entre as marcas com que está trabalhando e o trabalho que ele desenvolve. Afinal, ainda existe uma demanda pelo consumo dessas pessoas, alinhada à tendência que temos de confiar e consumir mais pessoas do que marcas”, analisa, acrescentando ser básica a preocupação com a construção da própria identidade, o que exige, na avaliação dele, um compromisso ético com seus seguidores.
Desafio
Diante dessa realidade, Ettore Medeiros reconhece: entrar em um mercado onde já tem tanta gente pode não ser fácil e, no mínimo, exige profissionalização. “Não é simplesmente ligar sua câmera e começar a fazer conteúdo sem nenhum norte. É preciso ter uma estratégia”, avisa, antes de admitir que um certo senso comum em torno dessa profissão, segundo o qual ser um influencer é fácil, deixa tudo ainda mais complicado. “Existe a crença de que pessoas que viraram influenciadores porque conseguiram viralizar, mas não é tão simples assim. Para começar, temos diferentes perfis de influenciadores, alguns muito nichados, que não vão precisam ter conteúdos virais”, examina, indicando que as categorias vão dos nano, micro e médio até os macro e mega influencers, cada um atingindo a um tipo de público específico.
“Além disso, nem sempre quem viraliza consegue manter os níveis de visibilidade e o engajamento após o primeiro impacto. Logo, mais uma vez, é preciso pensar estrategicamente”, conclui ele, ao reforçar a noção de que, ao contrário do pensamento comum, esta não é uma profissão fácil, que dispensa estudo e dedicação. Pelo contrário. Segundo Medeiros, aliás, até mesmo os criadores de conteúdo de entretenimento, lido socialmente como mais vazios, caso das famigeradas “dancinhas”, precisam se dedicar e traçar planos, inclusive planos de negócios, para, de fato, obter bons resultados.
FONTE: O TEMPO