Durante décadas, a tatuagem simbolizou ruptura, pertencimento e identidade. Hoje, cresce um movimento silencioso de arrependimento. Clínicas de remoção se multiplicam. Psicólogos observam mudança no significado do corpo como expressão permanente.
A tatuagem deixou de ser tabu. No Brasil, estima-se que cerca de 30% da população adulta tenha ao menos uma, segundo dados do IBGE e levantamentos privados do setor estético. Porém, ao mesmo tempo, aumenta a busca por remoção a laser.
O corpo, antes tela definitiva, passa a ser visto como espaço revisável.
O que a psicologia diz sobre tatuar o corpo
Pesquisas em psicologia indicam que a tatuagem cumpre múltiplas funções simbólicas.
Estudo da American Psychological Association (APA) aponta que tatuagens frequentemente estão ligadas a:
- Construção de identidade pessoal
- Marcação de fases de vida
- Elaboração de traumas
- Necessidade de pertencimento social
- Afirmação de autonomia sobre o corpo
A psicóloga clínica Viridiana Wexler, da Universidade de Miami, afirma que tatuagens funcionam como “âncoras emocionais”. Elas congelam um sentimento, uma crença ou uma relação em determinado momento da vida.
O problema surge quando a identidade muda, mas o símbolo permanece.
Impulsividade, juventude e decisão permanente
Estudos da Universidade de British Columbia, no Canadá, relacionam tatuagens feitas antes dos 25 anos a maior chance de arrependimento futuro.
A explicação é neurológica. O córtex pré-frontal, responsável por decisões de longo prazo, ainda está em desenvolvimento nessa fase da vida.
O que parecia definitivo aos 18 pode se tornar estranho aos 35.
Quando a tatuagem perde o sentido
Pesquisa publicada no Journal of Behavioral Medicine aponta que entre 20% e 30% das pessoas tatuadas consideram remover ao menos uma tatuagem ao longo da vida.
Os principais motivos de arrependimento são:
- Fim de relacionamentos
- Mudança de crenças religiosas ou políticas
- Entrada no mercado de trabalho formal
- Estigmatização social
- Envelhecimento da tatuagem na pele
Símbolos que um dia representaram liberdade passam a gerar constrangimento.
O crescimento da indústria da remoção
No Brasil, clínicas especializadas em remoção a laser registram crescimento anual médio acima de 25%, segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia.
O procedimento, caro e doloroso, virou mercado.
Cada remoção exige múltiplas sessões. O custo pode ultrapassar facilmente o valor original da tatuagem. Ainda assim, a procura cresce.
O arrependimento virou negócio.
Corpo como linguagem instável
Sociólogos apontam que a geração atual vive uma contradição. Busca autenticidade, mas habita um mundo acelerado, mutável e descartável.
O sociólogo francês David Le Breton, referência em estudos do corpo, afirma que a tatuagem perdeu o caráter ritualístico e ganhou contornos de consumo rápido.
O corpo virou feed. O símbolo envelhece mais rápido que a pele.
Tatuar menos, pensar mais
Psicólogos não condenam a tatuagem. Alertam para o contexto emocional da decisão.
Momentos de dor, luto ou ruptura tendem a gerar escolhas impulsivas. A tatuagem, nesse caso, funciona como tentativa de controle simbólico do sofrimento.
Quando a dor passa, o símbolo fica.
Uma marca do tempo — não da eternidade
A tatuagem segue como expressão legítima. Mas a ideia de permanência perde força numa sociedade que muda rápido demais.
O aumento das remoções não significa fracasso da tatuagem. Revela, na verdade, uma geração em revisão constante de si mesma.
O corpo já não é destino. É rascunho.
