Rio Doce: e agora após a decisão britânica?

Reconhecimento da responsabilidade abre a etapa mais complexa: cálculo das indenizações, possíveis recursos e definição de quem realmente terá direito a receber

A decisão da High Court of England and Wales, em Londres, que declarou a BHP legalmente responsável pelo rompimento da barragem de Fundão — considerado o maior desastre ambiental da história do Brasil — marcou um divisor de águas. Mas, para os atingidos, municípios e comunidades do Espírito Santo e Minas Gerais, a pergunta agora é: o que acontece daqui para frente?

A sentença encerra apenas a Fase 1 do julgamento, que tratava da responsabilidade. A etapa mais importante — e mais longa — começa agora: quantificar quanto a BHP pode ter que pagar e quem terá direito a receber.

A seguir, o ES FALA detalha, ponto a ponto, os próximos passos desse processo internacional.

1. Ação entra na Fase 2: cálculo das indenizações

A decisão britânica leva o processo para a chamada fase de danos (“quantum of damages”), quando serão avaliados:

  • danos ambientais ao Rio Doce;
  • danos sociais às comunidades;
  • perdas econômicas e materiais;
  • impacto a municípios;
  • danos futuros e lucros cessantes;
  • indenizações individuais.

Essa fase está prevista para ocorrer entre outubro de 2026 e março de 2027, segundo a própria empresa ao mercado financeiro.

É nessa etapa que a Justiça inglesa pode definir um valor bilionário, estimado inicialmente em até £ 36 bilhões (cerca de R$ 240 bilhões), segundo análises apontadas pela imprensa internacional.

2. BHP vai recorrer — e isso pode atrasar o cronograma

Logo após a decisão, a BHP informou oficialmente que pretende recorrer, buscando reverter ou limitar a responsabilidade atribuída no Reino Unido.

Esse recurso pode:

  • atrasar o início da fase de cálculo das indenizações;
  • limitar o escopo de quem pode ser beneficiado;
  • criar novas disputas jurídicas paralelas.

Ainda assim, o reconhecimento da responsabilidade continua válido enquanto o recurso não é julgado.

3. Quem poderá receber indenização? Nova análise caso a caso

A Justiça inglesa terá que definir quem realmente poderá seguir no processo. Isso porque milhares de pessoas já:

  • receberam indenizações no Brasil,
  • assinaram acordos,
  • ou deram quitação total de direitos em programas nacionais.

A Corte britânica vai analisar se esses acordos impedem novas indenizações ou se ainda há danos não reparados.

Essa análise deve ocorrer paralelamente à Fase 2.

4. Municípios atingidos continuam no processo

Outro ponto crucial: a Justiça inglesa reconheceu a legitimidade dos municípios brasileiros para seguir na ação — algo contestado pela BHP.

Isso significa que cidades capixabas da bacia do Rio Doce — como Colatina, Linhares, Baixo Guandu, Marilândia, São Domingos do Norte e outras — poderão requerer reparações específicas pelos danos:

  • ambientais,
  • econômicos,
  • estruturais,
  • sociais.

5. Impacto para o Espírito Santo: o que muda na prática?

A partir desta decisão, as comunidades e municípios capixabas atingidos passam a enfrentar uma nova etapa:

a) possibilidade real de indenizações internacionais

O reconhecimento da responsabilidade abre portas para valores adicionais aos já pagos no Brasil.

b) necessidade de organização documental

Quem quiser reivindicar indenização deve comprovar:

  • dano,
  • vínculo geográfico,
  • e ausência de quitação total em acordos anteriores.

c) pressão por cumprimento do Acordo de 2024

A decisão aumenta a cobrança para que os compromissos assumidos no Brasil em 2024 — de cerca de R$ 170 bilhões — sejam executados com mais rigor e transparência.

6. Linha do tempo: o que esperar daqui para frente

EtapaSituação
Responsabilidade (Fase 1)✔ Concluída em novembro de 2025
Recurso da BHPEm preparação; pode atrasar cronograma
Análise sobre quem tem direito a continuarA partir de 2026
Cálculo das indenizações (Fase 2)Outubro/2026 a março/2027
Fase 3 (casos individuais remanescentes)A partir de 2028
Pagamento ou implantação das decisõesApós conclusão das fases

7. O que essa decisão significa — de forma prática e objetiva

Para o leitor, especialmente para quem vive ao longo da Bacia do Rio Doce, como Baixo Guandu, Colatina, Marilândia e Linhares a decisão inglesa significa:

  • A tragédia não foi acidente — a Corte reconheceu negligência.
  • O processo não acabou — ele está entrando na parte mais longa e difícil.
  • As indenizações globais ainda serão definidas — e podem mudar todo o cenário de reparação.
  • Municípios capixabas continuam com direito de reivindicar.
  • A BHP vai recorrer, mas a condenação inicial permanece válida.
  • A fase de cálculo de danos será decisiva e pode resultar na maior indenização coletiva da história do Reino Unido.

FONTE: ES FALA