Qual o risco real de virar uma guerra mundial

O mundo acompanha com apreensão a escalada do confronto entre Israel e Irã, iniciada com ataques israelenses contra alvos estratégicos no território iraniano na sexta-feira (13), seguida por bombardeios iranianos contra cidades israelenses. O impacto imediato já se faz sentir em todo o Oriente Médio, mas a mobilização rápida de potências globais em torno do assunto reacendeu o debate sobre a possibilidade de o conflito sair do controle regional e envolver diretamente Estados Unidos, Rússia ou China.

Nos últimos dias, EUA, Rússia e China, além de países do G7 e aliados europeus, endureceram a retórica diante da crise. O presidente americano, Donald Trump, exigiu na terça-feira (17) a rendição incondicional do Irã e afirmou nesta quarta-feira (18) que todas as opções dos EUA estão sobre a mesa, incluindo um possível ataque. “Pode ser que eu faça”, disse Trump na Casa Branca ao ser questionado sobre o tema. O Pentágono informou também nesta quarta que está pronto para executar qualquer decisão de Trump e reforçou a presença militar na região do conflito, com o envio de caças F-16, F-22, F-35 e navios, além de evacuar parte do corpo diplomático americano de áreas de risco.

Em resposta, o Irã prometeu “danos irreparáveis” caso os americanos entrem na guerra e ameaçou atacar bases dos EUA e de aliados europeus no Oriente Médio.

O G7, grupo que reúne os sete países mais desenvolvidos do mundo, divulgou nesta semana, durante encontro no Canadá, um comunicado reafirmando o direito de Israel à autodefesa e classificando o Irã como “fonte de instabilidade” no Oriente Médio. Apesar disso, o grupo apelou por contenção e diálogo entre as partes. Por sua vez, o chanceler alemão, Friedrich Merz, resumiu o dilema que vive a Europa ao declarar que “Israel está fazendo o trabalho sujo pelo Ocidente”. Já o Reino Unido e França reforçaram seu apoio político a Israel, mas expressaram preocupação com possíveis ataques iranianos contra suas próprias bases na região.

Do outro lado, Rússia e China têm elevado o tom contra qualquer intervenção direta dos Estados Unidos no confronto. Moscou advertiu nesta quarta que um eventual apoio militar de Washington a Israel “teria consequências irreparáveis” para a ordem global. Já Pequim pediu “máximo autocontrole”, acusou os EUA de “adicionar combustível ao fogo” com as ameaças de Trump contra o Irã e iniciou a evacuação de seus cidadãos do território iraniano, além de monitorar de perto o impacto da crise sobre os fluxos globais de energia.

Apesar do ambiente de “alerta máximo”, analistas consultados pela Gazeta do Povo disseram que o risco de uma guerra mundial fruto deste conflito segue sendo limitada por fatores estratégicos e interesses nacionais das potências militares mundiais.

Para Frederico Dias, professor de Relações Internacionais do Ibmec de Brasília, o risco de eclodir um conflito global direto entre Estados Unidos, Rússia e China por causa deste conflito em curso no Oriente Médio é considerada baixa.

“Conflito direto entre Estados Unidos, Rússia ou China não é uma possibilidade real no cenário atual”, afirmou ele. Dias explica que, apesar da retórica dura, Rússia e China não têm interesse vital ou capacidade militar para se envolverem diretamente em defesa do Irã, ainda que o regime islâmico seja considerado um aliado estratégico para ambos os países na região. Segundo ele, o máximo que pode acontecer neste momento é uma entrada unilateral dos EUA no confronto, isso caso suas bases sejam atacadas ou haja uma ação iraniana com alto impacto sobre Israel.

“China e Rússia tendem a atuar por meio de apoio indireto – fornecendo armas, inteligência e apoio econômico – sem assumir o risco de uma guerra direta” contra o Ocidente, disse o professor.

Dias também destaca que, ao contrário de outras eras, o atual cenário internacional é mais equilibrado, com China e Rússia atuando para conter iniciativas unilaterais dos Estados Unidos, mas sem disposição de assumir riscos que possam levá-las a um confronto direto.

Já para Igor Lucena, economista, especialista em relações internacionais e CEO da Amero Consulting, a situação do Irã neste momento é de isolamento, ainda que conte com respaldo diplomático de Moscou e Pequim.

“China e Rússia historicamente apoiam o Irã em fóruns multilaterais, mas não demonstram interesse em intervir militarmente agora”, avalia Lucena.  

Sobre possíveis gatilhos para um eventual alastramento do conflito, ambos os especialistas apontam que um ataque efetivo do Irã contra bases americanas, contra o Estreito de Ormuz ou contra lideranças israelenses poderia obrigar os EUA a uma resposta militar direta.

“O fechamento do Estreito de Ormuz ou ataques a interesses americanos podem ser o estopim para uma intervenção”, ressalta Dias. Lucena acrescenta que, mesmo diante de uma retaliação dos EUA, a reação seria restrita ao Irã, pois nem China nem Rússia demonstram interesse ou capacidade de confrontar os americanos diretamente neste momento.

O uso de armas nucleares neste conflito também é visto como improvável, mas não totalmente descartado em cenário de ataque extremo à liderança ou infraestrutura vital de Israel. Ambos os especialistas lembraram que, apesar do discurso cada vez mais intenso do governo israelense, a superioridade tecnológica do país e a quase evidente ausência de ogivas iranianas ainda funcionam como freios à escalada nuclear.

Por fim, Lucena destacou que o próprio mercado financeiro já demonstra percepção de que o conflito em curso tende a permanecer localizado. Segundo o analista, o sentimento neste momento é de “contenção”, já que, de acordo com ele, “Israel controla a situação militarmente, e o Irã sofre forte pressão interna”.

Fonte: Gazeta do Povo