Indústria estuda tarifaço de Trump e economistas projetam freio em investimentos no Brasil

A preocupação se dá em função dos Estados Unidos serem o principal destino das exportações brasileiras no setor

Operário trabalhando em metalúrgica Foto: Foto Pixabay -

As recentes medidas protecionistas de Donald Trump, ao elevar tarifas comerciais para produtos importados nos Estados Unidos, acenderam a luz do alerta na indústria brasileira. Os desdobramentos do tarifaço implementado pelo presidente norte-americano, que estabeleceu alíquota de 10% ao Brasil – mas que chega a 25% na siderurgia, por exemplo, ainda geram divergências entre representantes da categoria e economistas. 

As duas partes não chegaram ainda a um consenso sobre o futuro das relações bilaterais entre os dois governos e do ritmo dos investimentos para ampliar operações. A preocupação se dá em função dos Estados Unidos serem o principal destino das exportações brasileiras no setor. Em 2024, as vendas de produtos ao território norte-americano chegaram ao valor recorde de US$ 31,6 bilhões, de acordo com dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham). A corrente comercial entre os dois países foi de US$ 80,9 bilhões no ano passado. 

Nesta quarta-feira (9), Trump anunciou uma trégua de 90 dias ao tarifaço contra mais de 75 países. Em meio a pausa, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) está elaborando um estudo para entender os riscos e oportunidades do protecionismo de Trump ao setor no Brasil. O superintendente de Relações Internacionais da entidade, Frederico Lamego, afirmou que nos setores em que o Brasil teve tarifas mais baixas do que concorrentes há uma tendência de vantagens. 

“Mas é muito preliminar para entender como é que isso vai se dar. Até porque, por outro lado, esses países continuam produzindo e eles vão querer muitas vezes exportar seus produtos para mercados como o nosso”, disse Lamego. Ele frisou que a cada US$ 1 bilhão exportados aos EUA, são gerados mais de 24 mil empregos no Brasil, evidenciando a importância de uma saída diplomática para evitar impactos à economia brasileira. 

O superintendente da CNI sinalizou prejuízos mais significativos à siderurgia, em função da alíquota de 25% ao aço e alumínio importados, estabelecida por Trump. “Já eram setores sensíveis no passado, mas a gente precisa calcular melhor, porque se de um lado essa tarifa de 10% foi linear, por outro lado, para outros países que tiveram aumento de tarifa, podem ver o mercado brasileiro como um mercado potencial de exportação e isso pode gerar novas ameaças a setores industriais brasileiros no médio prazo”, completou. 

Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, o tarifaço de Trump, estabelecendo taxa de 10% sobre os produtos brasileiros, representa uma vantagem competitiva ao Brasil. “Porque a tarifa de 10% não é impeditiva para os produtos brasileiros entrarem no mercado americano e pode se tornar uma vantagem competitiva em relação a países que tiveram uma tarifa maior. Então na nossa leitura, o pacote como ele está hoje, ainda sem negociação e ainda com perspectivas de negociação, ele pode ser mais positivo para o Brasil nos Estados Unidos”, ponderou Roscoe.

Ele defendeu ainda a possibilidade de abertura de mercado em outros países, em que os produtos americanos serão taxados e concorrem com os brasileiros. “É uma dupla vertente positiva na minha percepção”, completou o presidente da Fiemg que não acredita em um freio aos investimentos da indústria. O posicionamento, entretanto, é contrário ao da economista e professora da Fundação Getúlio Vagas (FGV), Carla Beni. 

Na avaliação dela, o protecionismo de Trump pode levar à suspensão de investimentos, em função da instabilidade nos mercados e risco inflacionário. “Você só pode fazer investimentos e executar o orçamento que você tenha planejado, se você tiver previsibilidade. E o que o Trump está fazendo no mundo é abalando a previsibilidade. É aí que mora o grande problema, porque as grandes empresas estão começando a bloquear aquilo que estava na programação”, assinalou Beni. 

Redesenho 

Na avaliação do presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), Rafael Cervone, o protecionismo implementado por Donald Trump, com o aumento de tarifas, representa um redesenho do tabuleiro da economia mundial. “E disparando sinais de alertas no Brasil”, avaliou Cervone. O presidente do Ciesp projetou um risco inflacionário aos norte-americanos com as sobretaxas. 

No Brasil, segundo ele, os desdobramentos desse cenário são ambíguos. “Estamos diante de uma tempestade comercial que não respeita fronteiras. As medidas adotadas pelo governo Trump comprometem a previsibilidade dos mercados e desorganizam cadeias produtivas inteiras, inclusive aquelas das quais o Brasil participa como fornecedor”, observou o presidente do Ciesp.

Para ele, o protecionismo norte-americano, além de provocar inseguranças no comércio internacional, impõe desafios extras à indústria brasileira. “Há tempos já enfrentamos custos elevados e excesso de burocracia. Agora, teremos de lidar com uma reorganização do comércio internacional em um ambiente muito mais hostil”.

FONTE : O TEMPO