O candidato do PTB à presidência, Padre Kelmon, está devendo impostos ao governo federal. Os débitos constam da base de dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e dizem respeito à Associação Theotokos, uma "organização religiosa" criada por Kelmon em 2015 e presidida por ele. No último debate antes do primeiro turno, veiculado pela TV Globo na quinta-feira, 29, o candidato do PTB reiterou ser favorável à redução da carga tributária no Brasil, sob o argumento de que o inchaço do Estado e o excesso de impostos atrapalham o desenvolvimento do País.

"Esse é o caminho? Cobrar impostos? Você (eleitor) não aguenta mais ser cobrado. E essa senhora aqui (a candidata Soraya Thronicke, do União Brasil) novamente repete que a solução é imposto único, é cobrar mais imposto. A solução não é essa, a solução é reduzir o Estado. Tirar os cabides de emprego", disse Kelmon no debate.

Por falta de pagamentos, os débitos da Associação Theotokos acabaram inscritos na dívida ativa da União - o que significa que o governo poderá, no limite, processar Kelmon para receber o valor devido. Apesar de constar como "ativa", a Associação Theotokos não possui site ou conta em redes sociais. O endereço informado à Receita Federal pertence a um supermercado atacadista, na periferia de São Paulo (SP), às margens da represa Billings. O valor devido é de pouco mais de R$ 1,2 mil.

O termo Theotokos é de origem grega e significa "mãe de Deus". É um título usado para descrever a Virgem Maria na tradição síria do cristianismo oriental, do qual Kelmon alega ser representante. Apesar de usar trajes e insígnias típicos de padres da Igreja Ortodoxa, Kelmon não é reconhecido como representante da Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia no Brasil. Nos últimos dias, o candidato sustentou ter sido ordenado padre pela Igreja Católica Apostólica Ortodoxa do Peru, uma instituição independente e sem ligação com o patriarcado de Antioquia.

Kelmon Luís da Silva Souza é natural de Acajutiba, no leste da Bahia, e tem 45 anos. Ele era vice de Roberto Jefferson, também do PTB, e assumiu a cabeça de chapa depois que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou o registro da candidatura do ex-deputado. O plenário da Corte entendeu que o ex-presidente do PTB estava inelegível até dezembro de 2023 por ter sido condenado no mensalão do PT ainda em 2013. Procurada pelo Estadão, a campanha de Kelmon não se manifestou para comentar o débito dele com a Receita Federal.

Até o momento, Kelmon só entregou a primeira prestação de contas parcial ao TSE, no último dia 13. No documento, a campanha do suposto religioso só discrimina gastos contratados com dois fornecedores: uma agência de publicidade e uma firma de contadores, despesas que ainda não foram pagas. Até agora, Kelmon não informou doações de eleitores ou empresas: o único aporte financeiro à campanha foi uma doação de R$ 1,54 milhão feita pela Direção Nacional do PTB.

Do total arrecadado, a campanha de Kelmon afirma ter comprometido R$ 1,2 milhão com a contratação de uma agência de publicidade sediada em Cuiabá (MT), a B2C Marketing. A empresa pertence a Ezequiel Bruno Gonzaga Cortez, conhecido como Bruno Cortez, um ex-assessor de Roberto Jefferson na época em que o presidente do PTB tinha mandato na Câmara dos Deputados. A B2C também é responsável pelas campanhas de outros candidatos petebistas neste ano.

Conhecido pelas "dobradinhas" com o presidente Jair Bolsonaro nos últimos dois debates, atuando como linha auxiliar do chefe do Executivo para atacar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Kelmon recebeu pelo menos 15 parcelas do Auxílio Emergencial durante a pandemia. O valor total foi de R$ 5,1 mil, segundo informações do Portal da Transparência.

A assessoria do candidato disse que ele não recebe salário como sacerdote da Igreja Ortodoxa do Peru e, por isso, precisou do auxílio para sobreviver. Ao TSE, Kelmon declarou patrimônio de cerca de R$ 8,5 mil em duas cadernetas de poupança. No debate da TV Globo, Lula o chamou de "candidato laranja" e Soraya Thronicke se referiu a ele como "padre de festa junina".